Continuando a saga. Partes 1 e 2.
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Olá meu nome é Guy Ligier
A segunda corrida da temporada seria realizada em Spa-Francorchamps, e com várias pequenas curiosidades.
A corrida seria disputada no antigo circuito de Spa, com seus longos 14 quilômetros, em 28 voltas, contra 32 do ano anterior. Foi também a estréia dos obscuros motores Serenissima, que você desconhecia. Estes propulsores só foram utilizados em três oportunidades, todas pela iniciante McLaren. Assim como no GP de Mônaco, que eu já havia mencionado no post anterior da série, foram gravadas cenas para o filme Grand Prix com vários pilotos, como Surtees, Bonnier, Bandini, Clark, Gurney e até o pequeno Guy. Mas notem, Jackie Stewart não participou. A explicação: cada um dos pilotos eram “dublês” para os pilotos fictícios do filme, e o “piloto do Stewart” estava se recuperando de um grave acidente que sofrera à aquela altura do filme. Isso deu um belo trabalho aos diretores da película, chegando até mesmo a alterar os rumos dos treinos, forçado Jackie a entrar na pista apenas em momentos propícios! Foi nessa corrida que a Lotus estreou seu novo carro, o Lotus 43, após três eventos utilizando o carro antigo. Por isso, Jim Clark era, seilá, o franco favorito à vitória, mais que o normal.
Me desculpem, mas isto tem formato de cocô.
Para o GP belga, 18 malucos pilotos compareceram. Entre eles estava o jovem Ligier, claro. No classificatório, Ligier conseguiu o costumeiro lugar no meio/fundo do grid. Ele fazia o papel de Jean-Eric Vergne, basicamente. O pole foi John Surtees, com um tempo 13 segundos mais rápido que o de Ligier. Para dar uma ajudinha, três pilotos não se classificaram para o grid: Peter Arundell, Vic Wilson e Bruce Mclaren. Todos com problemas mecânicos.
A corrida aconteceria sob um dilúvio monumental. Ainda na primeira volta, sete dos quinze carros abandonaram a disputa devido a acidentes. Quatro deles saíram na mesma curva, a Burnenville. Jo Bonnier deu um belo salto para fora da pista e aterrissou em uma casinha qualquer. Jackie Stewart bateu em um poste de telefone em plena Masta Klink, capotando e parando de cabeça para baixo. Graham Hill e Bob Bondurant, que também escaparam da pista naquele ponto foram até a ele e o socorreram utilizando um kit de emergência de um velhinho que estava assistindo a corrida. Na verdade, eu não sei se era um velhinho, desculpa. Esse acidente foi o mais grave da carreira de Jackie Stewart, onde ele fraturou o ombro, uma costela e sofreu graves ferimentos internos no intestino. Dali em diante ele passou a dar ênfase na luta pelas melhorias das condições de segurança na F1, pela qual ele ficou famoso. O último piloto a abandonar a corrida na primeira volta foi Jim Clark, traído pelo seu motor Climax, que não aguentou a chuva e acabou alagado, parando de funcionar.
Vruuum
A essa altura da prova, com apenas sete carros na disputa, não seria nenhum absurdo Ligier sonhar com pontos. Tudo bem que se manter vivo em condições como aquelas já seria considerado uma vitória.
O restante da prova ocorreu sem maiores problemas, já que não houve mais nenhum abandono. O pódio foi formado por John Surtees em primeiro, Jochen Ridnt em segundo e Lorenzo Bandini em terceiro. Mas e Ligier? Ah Ligier, por essa você não esperava, hein meu caro? Pela segunda corrida consecutiva, Ligier terminava na zona de pontuação mas não levava os pontos, pois não completou 90% da prova. Quatro voltas atrás, Ligier passou a prova brigando com seu Cooper. Sobreesterço e sobrepeso davam o tom do Cooper T81.
Sem pontos, mas com todos os ossos inteiros, Guy Ligier foi para Reims, participar do GP da França. Sem grandes atrativos off-race, a única curiosidade a se destacar nessa corrida é uma nota triste. Campeão do mundo em 1950, o italiano Nino Farina faleceu a bordo do seu carro pessoal, após sofrer um acidente enquanto ia assistir a prova. Para vocês verem, como a vida pode ser uma droga. Foi também a última corrida realizada no circuito de Reims-Gueix.
Me lembra levemente o desenho da cobra que engoliu o elefante no livro d’O Pequeno Príncipe. Se você não conhece, lamento
Contra 17 pilotos, Ligier conseguiu o 11º lugar no grid, beneficiado pela posição que herdada de Jim Clark. O escocês sofreu um acidente peculiar nos treinos, quando atingiu um pássaro e acabou machucando o olho. A pole position ficou com Lorenzo Bandini, a primeira de sua carreira. A corrida ocorreu sem surpresa. Apesar dos oito abandonos, nenhum deles ocorreu por acidentes. Guy se manteve na pista e estava em nono quando a corrida acabou. Acabou para o líder, pois Ligier estava seis voltas atrás, e por isso, pela terceira vez em três corridas, não foi classificado. O vencedor foi Jack Brahbam, que não vencia uma prova havia seis anos, além de ser a primeira vez na história em que um piloto venceu um GP correndo com carro que levava seu nome. Completaram o pódio o Ferrarista Mike Parkes e Denny Hulme, a bordo de outro Brahbam.
Seguindo a trupe formulaunesca, Ligier foi para a Inglaterra, participar da quarta corrida da temporada, em Brands Hatch.
Também gostaria de dizer que Brands Hatch é bem mais legal que Silverstone, só pra constar.
Pela primeira vez na temporada a barreira dos vinte competidores foi quebrada, e olha que a Ferrari nem participou da corrida! Devido a uma crise metalúrgica na Itália, os Ferraristas nem foram para a terra da rainha. Mas como Guy Ligier é um cara legal, destemido e que gosta de desafios, foi em um grid cheio que ele conseguiu sua melhor posição de largada no ano. E como eu não presto, contei uma mentira. Àquela altura do campeonato, todos os pilotos competitivos já dispunham do mais refinado material para competir, por isso a vantagem que Ligier dispunha no começo do ano havia se esvaído. O décimo sétimo lugar no grid mostrou a realidade. Lá na frente: Brahbam, Hulme e Gurney.
Palco do primeiro bom resultado de Guy
A corrida começou com um clima nublado, mas logo a chuva caiu sobre o solo inglês. Contrariando a lógica, nenhum acidente aconteceu, sabe-se lá como. Após longos 341 km, Jack Brahbam saiu vitorioso pela segunda vez seguida no ano, abrindo uma confoortável vantagem na liderança do campeonato. O pódio foi completado por Danny Hulme – 1ª dobradinha da Brahbam na F1 – e Graham Hill. Bruce McLaren, em sexto, ganhou o primeiro ponto da história da McLaren. Mas e Ligier? Ah, Ligier. Pela primeira vez, Ligier efetivamente terminou uma corrida. Ao terminar “apenas” cinco voltas atrás do líder, ele se mantece no limite dos 90% e pode ser mencionado na classificação final. Os bons ventos da mudança pareciam soprar na direção do francês.
Pareciam. Na próxima parte, o GP da Alemanha e uma mudança de rumos na carreira de Ligier.